Num primeiro momento, pode até parecer contraditório falar em consumo consciente no mercado supermercadista, mas as movimentações dos novos e antigos varejistas no combate ao desperdício e preservação dos recursos naturais provam que o conceito se torna uma prática cada vez mais recorrente — e que este é um ótimo negócio.
“Na América Latina há o crescimento da associação de grandes varejistas à agenda ESG, provavelmente pelos esforços das companhias em comunicarem suas ações”, explicou à SuperVarejo Raphael Cuartero, gerente de LinkQ da Kantar, acrescentando que, de acordo com um estudo feito pela empresa, em 2020 apenas 16% das pessoas acreditavam que os varejistas faziam muito pelo meio ambiente ou sociedade e, em 2021, esse número saltou para 42%.
Para o especialista, atender a mais essa demanda do comprador garante relevância para uma empresa ou marca. “O público percebe o seu papel no ecossistema de consumo, para garantir que suas ações são coerentes com seus valores, e buscam produtos que atendam e facilitem sua relação com os ideais. Além disso, o perfil mais engajado, os EcoActives serão mais de 50% da população mundial em uma década. Esse segmento possui um poder de compra expressivo”, acrescenta.
Continue a ler e confira dois cases que demonstram uma preocupação genuína com o tema nos propósitos de uma empresa antiga e outra recém-chegada ao segmento.
Justo Supermercado: tecnologia a favor da consciência
Startup de origem Mexicana, o Justo Supermercado chegou ao Brasil em outubro do ano passado, onde, inicialmente, opera apenas na cidade de São Paulo. Com investimento inicial de 40 milhões e atendimento 100% digital, de acordo com a empresa, seu diferencial está pautado no consumo consciente.
“Com fundadores mexicano, Ricardo Weder, e brasileiro, Ricardo Martinez, o Justo tem o propósito de usar a tecnologia e os dados para promover o comércio justo, estimular o consumo de produtos mais frescos, comercializar sob o uso consciente de recursos e oferecer um atendimento personalizado”, contou à SuperVarejo André Braga, vice-presidente de Expansão do Justo no Brasil.
Ele também acrescenta que, graças à tecnologia de planejamento de demanda, é possível reduzir os níveis de estoque, e o incentivo à venda de produtos a granel permite que o consumidor compre somente a quantidade que necessita. “Se há casos nos quais os produtos poderiam ser descartados, estes são doados a bancos de alimentos, sempre que possuem condições de consumo, evitando o desperdício”, diz.
Atuando com equipe de entrega e centros de distribuição próprios, a empresa assegura qualidade nos produtos perecíveis, incluindo o hortifrúti. Para efetuar as compras, os clientes acessam o app ou site, adicionam os produtos e, no processo de finalização, escolhem o horário da entrega.
Também existe a possibilidade de o cliente doar recursos financeiros à ONG Banco de Alimentos, que atua no combate à fome e ao desperdício de alimentos, sendo que o Justo dobra a doação. Fora isso, a cada cem reais em compras, o supermercado repassa um real à organização.
O executivo acredita no potencial de crescimento da empresa no País: o esperado era duplicar as vendas de outubro para novembro, entretanto elas triplicaram. “Foram 40 mil pedidos nos dois primeiros meses”, revela, pontuando que em 2022 a ideia é começar a atender outras cidades e inaugurar a operação em outro estado.
Coop: exemplo que vem da velha guarda
Com 67 anos de história e 113 unidades de varejo entre supermercados, drogarias e postos de combustíveis localizados no Grande ABC (SP), São Paulo (SP) e interior paulista, a Coop afirma que o consumo consciente está no DNA de seus princípios cooperativistas.
“A gente acredita que o consumo pode ser muito mais do que fazer compras e também numa economia mais consciente, que busca um bem comum”, esclarece à SuperVarejo o analista de Responsabilidade Social da Coop, Murilo Venâncio da Silva.
Entre as iniciativas encabeçadas pela empresa nesse sentido, ele destaca o projeto que, desde o ano passado, leva às lojas produtos alimentícios e bebidas de pequenos e médios negócios do Grande ABCDMR (Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano, Diadema, Mauá e Ribeirão Pires).
Segundo Silva, além de fortalecer a economia local, a ação favorece o meio ambiente ao reduzir a emissão de gases poluentes pela redução da distância percorrida do produtor à gondola. “Ganha também o consumidor, que passa a ter acesso a itens mais frescos e naturais.”
A tarefa de captação dos empreendedores é realizada em parceria com a Local.e, plataforma que conecta marcas locais e varejistas. No projeto, a Coop busca adequar as condições comerciais, visando a saudabilidade dos negócios, além de disponibilizar espaço exclusivo para esses itens.
Para combater o desperdício alimentar, a rede afirma seguir procedimentos minuciosos na aquisição, recebimento, armazenamento e manuseio de produtos. Mercadorias perecíveis próximas ao vencimento, e em perfeito estado de consumo, são vendidas com desconto. Já os impróprios para a venda, mas próprios para o consumo, são doados para bancos de alimentos das cidades onde a rede atua.
Além disso, para conscientizar os colaboradores, no ano passado alguns dos refeitórios da empresa receberam os “desperdiciômetros”, que mensuram e sinalizam o nível de desperdício nas áreas.