Por: Antônio Sá, professor de Varejo da FGV e sócio fundador da Amicci.

O maior evento do varejo mundial, a NRF Show (National Retail Federation), aconteceu novamente em Nova Iorque no último mês de janeiro. Reconhecida por reunir em seus palcos os principais empresários e executivos do setor, trouxe neste ano um grupo seleto de CEO´s de alguns das principais redes do varejo alimentar dos Estados Unidos, como Walmart, Target, Wholefoods, Albertsons e Sprouts Farmers Market.

Em um período pós pandemia, em que os varejistas americanos sofreram e ainda sofrem com carência de colaboradores para suas operações, necessidade de aumentar a segurança nas lojas, clientes com poder de consumo menor e com alta da inflação, e ainda por faltas de produtos por conta de rupturas na cadeia de distribuição, as palestras trouxeram discursos bem serenos, resgatando o que é realmente essencial no varejo. O tema mais falado: sortimento.

Um dos principais temas explorados nas palestras foi a importância de entender o cliente e suas preferências na hora de escolher o produto. Os varejistas devem ter uma compreensão profunda de seu mercado-alvo, incluindo seus hábitos de compra, preferências e valores. Ao analisar os dados do cliente, os varejistas podem identificar tendências e padrões que os ajudam a tomar decisões informadas sobre seleção de produtos, preços e posicionamento.

Estou certo de que muitos varejistas vão pensar: “Mas eu já conheço muito bem os meus clientes. Eu já os atendo há muitos anos aqui nas minhas lojas”. O problema é que o cliente mudou muito nesses últimos anos. Adquiriu novos hábitos. Hoje, faz novas escolhas. Sem falar em uma massa grande de consumidores da geração Z que está entrando no mercado de consumo e visitando nossos supermercados. São os nativos digitais que possuem uma nova mentalidade de consumo.

Foi interessante perceber a humildade desses gestores de redes gigantes, admitindo que precisam aprender muito sobre seus consumidores, realizar muitas pesquisas, para poder tomar decisões mais assertivas de sortimento. E um termo recorrente para prestarmos muita atenção: Curadoria de Sortimento.

A curadoria de sortimento visa oferecer aos clientes um conjunto de produtos que atenda às suas necessidades e desejos, enquanto também se alinha com a estratégia da empresa. Isso inclui a seleção de produtos de alta qualidade, tendências atuais do mercado, diversidade de preços e de segmentos de mercado. Ou seja, cada produto precisa ter uma razão muito clara para existir no sortimento. A presença do produto não pode ser em função de uma negociação transacional. A curadoria do sortimento pressupõe que os produtos foram escolhidos com muito cuidado, muita ciência, para encontrar o interesse do cliente alvo do nosso supermercado.

“Compelling Assortment”, outro termo que foi bastante citado nas palestras na NRF 2023 e frequentemente usado em marketing do varejo, é utilizado para descrever uma seleção de produtos ou serviços que são verdadeiramente atraentes para os clientes. Uma boa tradução para “compelling assorment” é sortimento convincente. Uma gama de itens de alta qualidade, relevantes para as necessidades e preferências do público-alvo.

Brian Cornell, que é o CEO da Target, revelou algumas das principais táticas que a empresa adotou ao longo dos últimos anos e que vem trazendo enorme diferenciação para a rede, criando o sortimento relevante.

Brain comentou que a Target segue firme com três grandes pilares em suas linhas de produtos:

  1. Marcas Líderes – mantém em linha os produtos com as marcas nacionais, que são significativas para os clientes, pois são itens largamente conhecidos e que sempre trazem novidades, após muito investimento.
  2. Marcas Próprias – essa foi uma enorme guinada que a Target vem empreendendo há muitos anos e que provocou uma mudança substancial em seu sortimento, produzindo uma diferenciação grande através de produtos com alta qualidade e sempre surpreendendo o consumidor. Ao visitar algumas lojas da Target, pude perceber a enorme variedade de suas marcas, com destaque para a Good & Gather. A rede faz questão de dar o melhor destaque para as suas próprias marcas.
  3. Marcas de pequenos fornecedores – normalmente, os fornecedores menores são desprezados pelas grandes redes de varejo, por não conseguirem oferecer altos volumes dos seus produtos e também por não conseguir atender a todas as lojas. A Target considera que esses fornecedores são capazes, porém, de oferecer produtos únicos, distintos do que existe no mercado, muitas vezes atendendo a nichos de consumo que interessa aos clientes.

É através do desenvolvimento desses três pilares e uma seleção acurada dos produtos, que a Target vem construindo o seu “Compelling Assortment”, o seu sortimento relevante.

Muito falamos de uma concorrência crescente, mas pouco falamos em como criar um diferencial competitivo através do sortimento, e que ao final, vai nos tornar um supermercado singular aos olhos dos consumidores.